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13 de junho de 2008

SANTO MESTRE - Osho fala aos seus arcanos (II)



Osho dialoga com o Tarô. Não só com o que leva o seu nome, mas com todos os tipos, de todas as épocas e cores. Hoje, há exatamente um ano e meio da publicação do primeiro artigo, eu apresento mais uma carta ao místico espiritualmente incorreto. Procuro por novas analogias em minha biblioteca mental enquanto tomo o sagrado café da tarde. Aliás, um café-tarot com direito a amigos e arcanos à mesa posta. São várias as semelhanças e as roupagens, algumas totalmente surreais. O discurso do mestre às lâminas prevalece como conchas no oceano. Ouso mudar a ordem das cartas: o Louco acima do Eremita. O penhasco, a escuridão. A montanha, a existência. Assim o jovem mergulha em si, já que “descobrir o seu ser é o começo da vida. Então, cada momento é uma nova descoberta, cada momento traz uma nova alegria.”


O Eremita e O Louco • Osho Zen Tarot

Sua luz ilumina a escuridão. Seu sorriso prenuncia o próximo passo. Não há medo algum. A queda do corpo? Bom, se estou mexendo com o Pendurado, então analisemos por outro prisma: A Nova Visão. Não é exatamente essa a intenção que deve obter o enforcado, crucificado e apostolado arcano 12?




O Pendurado de Marselha e a Nova Visão

Desde o artigo anterior tenho analisado o arcano 5, O Sacerdote. Polêmico, se compararmos a Osho. A briga é feia, dizem os mais desavisados.“Eu não sou um filósofo. Eu não sou tentando criar uma filosofia. Eu não sou um teólogo também. Assim, eu não tenho nenhum sistema de crenças.” Já adianto: não há como considerá-lo Papa se “todas as crenças são venenosas. Um sistema de crenças é um consolo, uma mentira muito doce, confortável e conveniente, pois dá segurança. A verdade só surge quando as crenças forem destruídas.



Mestres em vermelho: Osho e O Papa de Marselha

Bueno, o Louco já está avisado: “A busca pela verdade começa quando você deixa de lado todas as crenças. Se você pode saber, se é possível saber, então porque se contentar em acreditar?” Quanto ao Eremita, “o pico mais alto da consciência é quando você é apenas um ser – sem nada fazer, imóvel, profundamente silencioso, como se não existisse mais. Subitamente toda a existência começa a derramar flores sobre você.”


Imagino uma das confortabilíssimas cadeiras de Osho frente ao Hierofante, cujos súditos voltam suas cabeças na direção do guru: “Vocês acreditam em alguma coisa, mas não sabem nada. Acreditam em teorias.” A santidade ficaria furiosa, creio eu. Os argumentos do Mestre sobre religião, papado e sacerdócio são fortíssimos. Convencem, até. São Francisco de Assis, por vezes “arcanizado” como Louco e Eremita, servirá para apresentar as novas idéias.



São Francisco de Assis, do Tarô dos Santos de Robert Place
O Eremita do Golden Tarot, de Kat Black


Peregrinação. “A vida deve ser uma busca – não um desejo, mas uma procura; não uma ambição para se tornar isso ou aquilo, o presidente de um país ou um primeiro-ministro, mas uma busca para descobrir “quem sou eu?


Eis o diálogo: “você é tão sensível que até mesmo a menor folha de grama passa a ter uma imensa importância para você. Sua sensibilidade lhe deixa claro que a menor folha de grama é tão importante para a existência quanto a maior estrela. Essa folha de grama é única, é insubstituível, ela tem sua própria individualidade.


Grama? O que temos ao pé do caminhante de Marselha?


Todos os diálogos possíveis, começando pela cor dos cajados
O quinto arcano fica entre eles


É clara a mensagem para o Louco de Assis: “Essa sensibilidade criará novas amizades para você – amizade com as árvores, com os pássaros, com os animais, com as montanhas, com os rios, com os oceanos, com as estrelas, pois a vida se torna mais rica na medida em que o amor cresce, em que a amizade cresce.


São Francisco também caminha pela escura floresta ao lado de um gamo, na colagem primorosa de Kat Black. Autêntica comunhão com seus irmãos, os animais. Ele realmente existe, não foge de seu tempo, já que é o seu próprio tempo. Faço dele as palavras de Osho: “Nós pertecemos intrinsecamente à existência. Nós somos partes da existência, somos o seu coração.” É ele o espírito que liga os dois irmãos arcanos, sem deixar o humor de lado, já que é importante em qualquer fase ou relação, indispensável em qualquer jornada, até mesmo à interior. O Eremita marselhês sorri, você vê? Como um anfitrião que aguarda os (s)eus convidados. Uma festa dentro de si. São Francisco sabe que “a risada é a própria essência da religião”, que “a seriedade nunca é religiosa. A seriedade pertence ao ego, é precisamente parte da própria doença”, lembrando de quando se deparou com a lepra. Sermão aos pássaros, que voam livres como ele próprio.


São Francisco de Assis: 
os três arcanos se encontram em nítidas senelhanças na pintura de Giotto

Leva consigo este ensinamento, que “toda brincadeira da existência é tão bonita que a risada é a única resposta possível a ela. Somente a risada pode ser a verdadeira oração, a gratidão”, enquanto o Louco se esgueira pra ouvir esta passagem. Pura identificação. Por falar no arcano zero de Ma Deva Padma, sabemos que ele não tem como voltar atrás – ele já deu o passo inicial, ou final. Sua trajetória, à mente comum é sempre desviar-se do penhasco, ou perguntar o motivo de tal “suicídio”. Mas sua jornada é como o mecanismo de uma piada, de uma consulta às cartas: “a história vai numa direção e, de repente, ela muda de direção!


Nem falei que o Louco ri porque é óbvio. É assim que ele medita, pois “quando você realmente ri, durante aqueles poucos momentos você está num estado profundamente meditativo”. E ele ri de verdade, até o pensamento parar. Ele não, só o pensamento: continua dançando, pois “a dança e o riso são as melhores portas, as mais naturais, as mais facilmente acessíveis.


Sannyasins rindo com o mestre

O Louco ouve: “se você realmente dançar, o pensamento pára. Você dança sem parar, girando, girando... e você se torna um redemoinho – todas as fronteiras, todas as divisões desaparecem. Você nem mesmo sabe onde seu corpo termina e onde a existência começa.” E ele salta. “Você se dissolve na existência e a existência se dissolve em você; há uma superposição de fronteiras” – como a do Eremita, por certo. Deve ser por isso que o velho de Assis nada possui: “se você é uma pessoa meditativa, você dá, você compartilha – você não acumula, você não é mesquinho. Como você pode possuir? Como você pode reclamar que é dono de algo?” Eis a indignação do Pontífice por sempre se encontrar rodeado de luxo e comodidades de suas capelas. Aliás, falando nelas, “não há necessidade de ir à igreja, ao templo ou à mesquita; onde você estiver, seja bem-aventurado, e o templo estará presente” – diz ao arcano sem número. Uma crítica, talvez, às instituições que convertem à base de dinheiro e lavagem cerebral. “O templo real é criado pela bem-aventurança”.


Sobre as técnicas espirituais, Osho é enfático. Louco. Renunciador. “Você precisa se lembrar de que tudo deve ser abandonado para que você permaneça em sua total pureza. Mesmo uma experiência espiritual corrompe; ela é um distúrbio” – e voltamos à lição essencial ao Caminhante. Pura metáfora para a humanidade sedenta por princípios e doutrinas. Meras conchas no oceano de tudo. E ele continuaria tranquilamente acomodado, movimentando sua xícara. Não há discussão que seja burlada pela verdade. Nem prazer maior que a renúncia.



Mais café?

Já trago. Com mais arcanos.


Leo
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IMAGENS
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13 de janeiro de 2007

LOUCO MESTRE – Osho fala aos seus arcanos (I)


Vários anos se passaram desde a primeira vez em que me deparei com livros e vozes citando Osho. Pra quem não sabe, ele foi e é Bhagwan Shree Rajneesh: o guru indiano que alimentou o coração de seguidores (ou melhor, renunciadores) em todo o mundo. Temido, amado e espiritualmente incorreto. Devido aos seus discursos nada comuns, a identificação com a ideia de renúncia foi clara — fisgou minha atenção e todo o resto.

Tempos depois, enquanto garimpava alguns decks numa livraria, coloco as mãos no Osho Zen Tarot, pintado pela artista plástica Ma Deva Padma que também se embriagou com seus ensinamentos. Desenvolvido ao longo de cinco anos, o projeto fora iniciado com a aprovação do próprio mestre e hoje consiste num belo e enigmático instrumento oracular. A arte da vida em cartas. Nas lâminas, várias representações de seus insights que assustam e encantam buscadores há mais de cinco décadas. Mesmo que sua visita à Terra tenha terminado em janeiro de 1990, a mensagem ainda permanece vivíssima, cada vez mais arrecadando dinheiro. Uma herança espiritual criativa, com metáforas e analogias sempre inovadoras. Não, não é pra qualquer um.


Pois bem, com o maço em mãos, me lembro de suas palavras: Transforme as pequenas coisas em celebração”. Tiro duas cartas e abro um sorriso pela surpresa, O Louco e A Solitude (o tradicional Eremita). Irmãos de Espírito que me jogam aos olhos suas semelhanças.




Ambos estão à beira de um penhasco. O Ermitão — quase sempre parado em terra firme — aqui caminha na escuridão, próximo a um abismo. O Louco, inebriado, deve saber que sua jornada se estende às gélidas montanhas do fundo da paisagem. É lá que se encontra o velho monge, talvez numa caverna fria, iluminada apenas por sua presença. Alongando as comparações, vemos a irmandade entre esses arcanos e os concebidos por Pamela Smith: o dia ensolarado contrasta com os montes nevados do Louco, enquanto o Eremita vê bem onde pisa, mesmo com a lamparina. No topo, puro controle e rigidez.




Esse mundo onde encontramos o velho sábio do tarô Rider-Waite representa o nível de conhecimento que ele conquistara, o qual o Louco ainda tem de alcançar. Ambos os cajados simbolizam o poder, o comando intelectual e espiritual. A dança em direção ao penhasco é contínua, como a experiência que Osho oferece. “Não é esse o caminho para o saber – o conhecimento não é o caminho para o saber.” – contradiz o mestre do primeiro par de arcanos. Questionando-o sobre qual é o caminho, os dois logo escutam: “A admiração. Deixe que seu coração dance maravilhado. Encha-se de admiração: pulse com ela, inspire-a, expire-a. Por que tanta pressa para conseguir a resposta?”


Os Loucos sentem a mensagem. Eles nada esperam, nada planejam. A cabeça diz: “Pense antes de saltar.” E o coração diz: “Salte antes de pensar.” O Eremita e o Louco. A cabeça e o coração, respectivamente. Seu andarilho está aprendendo que “a vida é um fim em si mesmo. Ela não é um meio de se chegar a um fim, ela é um fim por si só. O pássaro em pleno vôo, a rosa ao vento, o sol nascendo pela manhã, as estrelas à noite, um homem apaixonando-se por uma mulher, uma criança brincando na rua... Não existe propósito algum. A vida é simplesmente usufruir dela, deleitar-se com ela. A energia está transbordando, fluindo, sem absolutamente propósito algum.”


E lá vai o radiante bufão, confiante, seguindo até o fim. Uma grande diferença entre os colegas "sem número" é que o de Waite carrega sua trouxa de experiências, enquanto o de Osho leva somente uma rosa branca. A pureza em si, a cor do silêncio absoluto ou ainda da Sabedoria, na iconografia sufi. A mão esquerda vazia despede-se do que viveu. Ou acaba de deixar em terra sua pequena bagagem para distrair o cachorro insistente. Ele quebra o hábito e questiona o todo, corre o risco e continua, pois “ninguém sabe o que pode acontecer. A pessoa deixa de lado tudo o que conquistou; tudo com o que tem familiaridade e parte para o desconhecido, sem nem ao menos saber ao certo se existe alguma coisa na outra margem – ou se existe outra margem.”

De fato, ser louco fere muitas pessoas. “Elas não aceitam a idéia de que você tenha alcançado alguma coisa que elas perderam. Elas tentarão, de todas as maneiras, torná-lo infeliz, tentarão te trazer de volta ao rebanho”. Não é essa a função do animal? Mas o Eremita não quer voltar ao rebanho, mesmo que possa. “Solidão é quando você está sentindo falta do outro”, Osho explica a ele, enquanto sua própria luz o guia. "Solitude é quando você está encontrando a si mesmo”, rebatizando-o então.


“A mente comum sempre joga as responsabilidades nos outros, diz sempre que é o outro quem faz você sofrer”, mas não há culpados, pois ambos estão sozinhos. Seus passados já congelaram, petrificaram no tempo. Aqui não lhes cabe culpar alguém, esse venenoso hábito. Aliás, Osho alerta que, “na verdade, toda malandragem e trapaça deste mundo servem para nos deixar conscientes.” Eis o Grande Rito. Da consciência. À consciência.


“Você está só no mundo: você veio ao mundo só, você está aqui só, e você deixará este mundo só.” A trouxa vazia e a flor à Existência, pois todas as opiniões alheias ficarão para trás; somente os seus sentimentos originais, somente as suas experiências autênticas o acompanharão até mesmo além da morte.” Apenas as qualidades, sem o peso sobre o ombro.



Osho como o nono arcano de Waite

Pura maturidade, que não tem nada a ver com a tal rigidez. Ao contrário, ela deve traduzir a flexibilidade que o Louco possui, assim como o Eremita carrega a loucura. São os únicos opostos, as únicas qualidades que devem se mesclar. É a troca possível. A vida alheia nunca lhes interessa, pois vislumbram que “a causa da infelicidade está no apego que temos aos outros, na expectativa em relação aos outros, na esperança de ganhar felicidade dos outros.” Sozinhos por opção, não por sina. Nem missão.


Quanto à vida de Osho, várias situações remetem aos dois arcanos, como o fato de jamais conseguir se relacionar profundamente com alguém desde a infância. Sobre a perda seus avós, as pessoas que mais amou, revela que "a condição era de total escuridão. Era como se eu tivesse caído no fundo de um poço escuro. Naquela época, eu sonhava muitas vezes que estava caindo, caindo, e entrava cada vez mais num poço sem fundo. Ficam nítidas as semelhanças com as lâminas: "Não havia mais nada além da escuridão e da queda, mas aos poucos fui aceitando até isso. Senti muitas vezes que precisava concordar com alguém, devia me segurar em alguma coisa ou aceitar qualquer resposta, mas isso não estava de acordo com minha natureza. Nunca fui capaz de aceitar o pensamento de ninguém.”


Esse louco pulou. Esse velho tornou-se iluminado. E ambos jamais ouvirão os outros. Caso contrário, a loucura e a maturidade estariam perdidas. “Essas qualidades são suas únicas companheiras. Elas são os únicos valores verdadeiros, e as pessoas que as alcançam, somente estas vivem. As outras fingem viver.”


A jornada continua.

As semelhanças e os diálogos também.


L.




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Santo Mestre: Osho fala a seus arcanos II