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26 de dezembro de 2011

ANIVERSÁRIO: TEORIA E PRÁTICA

Esse adubar do instante vivo
em pequenos vislumbres de memórias,
as siglas pessoais da arte,
mnemónicas para reconhecer-me.

Fiama Hasse Pais Brandão


Wooden Jigsaw Puzzle 
da mostra 'Ciencias Naturales' de Juan Gatti,
o artista dos cartazes de Pedro Almodóvar

Mais importante que o 31 de dezembro e o 1 de janeiro é o dia do Aniversário. O Retorno Solar é auspicioso. Um encontro e tanto. Tanto quanto as tradicionais festanças em torno da virada do ano, quando a maioria mantém a hipocrisia geral de prometer mudar e ser cada vez melhor e não cumprir nem metade do que se propagou durante o ano desgastado. Mas o durante o Aniversário não é bem assim. Não deveria. O lance pertinente é reavaliar as situações e as atitudes. Deixo de lado a maioria das superstições. Por isso, no dia de hoje, retorno aos rituais que brotam de mim.

Quando faço aniversário, penso um tanto no arcano 13, A Morte. A parteira negra acenando para mim. Mas não é um conceito grotesco, mas uma presença cujo intuito é fazer com que a cada ano me prepare em relação a tudo, Morte é regeneração. E sim, há muita vida na morte. A pele enrijece (se você cuida dela). Os músculos pesam. A coluna pede cada vez mais postura. A vista exige cuidados. E a beleza (podem me chamar de grotesco, agora) também está n'A Morte. Com o passar dos anos há melhorias pessoais. E negligências, para a festa ficar completa.

Death | Crowley-Harris Thoth Tarot.
AGMüller, 1986

E realmente há uma linguagem secreta dos aniversários, não? Sim, e muito proveitosa. 26 de Dezembro é o DIA DO INDOMÁVEL, segundo o livro de Gary Goldschneider e Joost Elffers*. Dia em que o truque de espelhos é tão bem realizado que pode passar em vão se não houver uma conduta simbólica, digamos, para perceber até que ponto sigo a nossa bem-aventurança. O meu aniversário é um fato isolado, costumo dizer. Um dia fora do calendário. Não é nada mole celebrar logo depois do Natal, com a correria das festas e das viagens na pauta.

Calor demais. Saturno, meu velho, rindo da minha cara por me fazer ficar entre poucos: como planejar uma (outra!) festa numa época tão conturbada? Não dá, desde sempre é complicado. E nem sei se eu me dedicaria a algo do tipo, sabe? Tem sido o momento em que me retiro um tanto e reflito sobre o ano que passou. Mas reflito MESMO. Sobretudo em relação ao que não passou. Ou eu engulo nesse limiar de transformação ou eu trato, aquiagora, sem papas na língua e no coração. Um dia de poder pessoal. Sobre mim e sobre o mundo.


Der Stern | Haindl Tarot
U.S. Games, 1988

Sou adepto das Constelações do Tarô. Temos um arcano na soma de nossa data de nascimento. O meu é o 8, A Justiça. O fator oculto dessa lâmina, que é outra, é a 17, A Estrela. Minhas lições de vida, digamos. Além de uma miríade de Menores que também ensinam, jogam na cara e fazem gozar. 


O TAROT, UM DIÁRIO

Tarot Journal | Traci Bunkers, 2007


Deixei os cadernos pautados há anos. Não registro quase mais nada. Só os arcanos. E os arcanos servem, sim, como páginas de um diário. Começo básico: tire uma carta por dia. Conselho com duração de 24 horas, ou menos. Registrá-lo tende a ser importante para avaliar, no final do dia ou do mês ( ou no aniversário!) o quanto você respeitou aqueles símbolos e, ainda mais, como eles se fizeram presentes naquele período. Páginas da vida. Mecanismos de papel encerado para tonificar a alma. O Tarô aceita o papel de ossatura das crônicas de todos nós.

O aniversário, portanto, não é um dia triste ou preocupante. Sei d'As Moiras apalpando a textura do fio, claro que sei. Compactuo com Elas. Uma marcação temporal para o fatídico. Até porque o inefável dança entre nós. Aniversário é a data em que vale trazer à consciência o peso das experiências — jamais negar a vida, mas senti-la. De verdade. E afirmo, agora, que ninguém 'faz' aniversário. Ele é que faz a criatura. Instiga, entristece, encoraja, envelhece, enrola. Mas também enriquece. De sabedoria e de algum sabor que o pomo do tempo carrega.

Sei dizer que encarar a Ceifadora como a Parteira pode ser útil, pelo menos a nível pessoal. Não por conformismo de que tudo acaba. Essa noção pouco conforta, mas é uma verdade nua-dura-crua e necessária a ser assimilada todos os dias. Mas justamente por ser possível administrar a existência com várias cores diferentes. As responsabilidades e os significados estão aqui, por enquanto. Passar incólume ou inteiro por essa vida é um baita sintoma de preguiça e descaso. Há de se ter um gosto pelas próprias cicatrizes.

Presente? A capacidade de assumir as tolices, reconhecer as boas sacadas e saber o meu tamanho. 'Nem pra mais nem pra menos', como diz Bethânia. 'O meu tamanho.'


Drink your Bliss 
Instagram @leochioda

Agora vou lá renascer um pouco — ler e escrever vertiginosamente, obrigado — e dar atenção aos telefonemas, e-mails, à campainha e às cartas. Ah, as cartas. Aproveito para fazer os votos de que você, que me lê e estuda o Tarô com paixão, se comprometa ainda mais com ele. De verdade. E que o necessário, só o necessário, seja sinônimo de excelência. Sim. 


Soul making. 
Always.


L.


*A Linguagem Secreta dos Aniversários

Editora Campus, 1999.

19 de julho de 2011

UMA ODISSÉIA MEDITERRÂNEA

Para ler ouvindo Loreena Mckennitt - A Mediterranean Odyssey.
Clique nas imagens para vê-las no tamanho original.



O Tarô é uma grande e longa viagem. Quem desconhece essa afirmação desconhece a própria natureza dos arcanos, que num vislumbre rápido pode sugerir o galope dos cavalos d´O Carro, por exemplo. Ou do próprio Louco, andarilho por excelência, aquele que desfruta dos caminhos como se fossem pêssegos suculentos num dia quente entre o sol e a sombra de uma árvore sábia. Estou há quinze dias na Europa e me dei conta do quão o itinerário traçado é exótico. Mediterrâneo.

Valete de Ouros do Scopa, jogo tradicional italiano, em Siracusa.
Il Sole, loja arcana na Taormina.


Houve a Andaluzia, onde
 João Cabral de Melo Neto me cantou os poemas da Sevilha e me vi bêbado com a magia flamenca dos azulejos coloridos. Na Itália a eterna Roma e depois a Umbria e a Calábria, até provar os perfumes de Sorrento em cada limão, sorvete e prato típico. Já foi a vez da Sicília, em que Taormina recebe os turistas com seus arcanos em riste, tal como é a cidade. Falo dos arcanos porque em cada ponto dessa viagem eles aparecem. Foi lá que avistei o bar IL RE DI BASTONI, onde do lado de fora havia uma placa toda estilizada e, dentro, uma camiseta vermelha com o arcano em destaque. Pirei na hora. Era a última sendo vendida e veio parar nas minhas mãos.




Il Re di Bastone, um pub na Taormina, com direito a camiseta.

De lá, uma boa história pra contar pros sobrinhos-netos: mais uma peregrinação até a boca de um vulcão. Desta vez o Etna, o maior do continente. Caminhar sobre as pedras frias de lava e dar-se conta da atmosfera marciana do ambiente, é possível ir aos limites do que se pensa enquanto viajante. Enquanto arcano vivo. O Louco ali.



O Etna que explode a todo instante e faz o coração vibrar.

Depois de visitar os templos de Jupiter, Zeus e Hércules em Agrigento, onde colhi pedras e azeitonas para uso mágico posterior, foi a vez da caótica cidade de Catania me surpreender. Na entrada do Caffè Pepe, encontro um arcano no chão: LA GIUSTIZIA. Um estado de serenidade logo tomou conta de mim naquele calor de 38 graus. Ofício e caminho validados pela portadora da balança.


Arcano VIII do 'Tarocco Indovino' (Dal Negro)

aparentemente lançado pelo jornal italiano La Repubblica.

Uma
strega me disse que quando uma imagem se repete, o espírito do que ela representa se perpetua. É, tem sido assim. Trunfos em cada lugar que visito. Aliás, as cidades são mensageiras. Aonde quer que você esteja, sinta o lugar. Nem sempre pode ser agradável, mas a experiência é que faz a diferença. O tarólogo, assumindo o seu papel de Andarilho, tem o poder de (re)conhecer os arcanos em uma manifestação folclórica, na decoração de um ambiente e também na estrutura social e no modo como as pessoas se comportam. As figuras das quatro Cortes condensados em cada um de nós.


Nos jardins do Real Alcázar, em Sevilha.

Sigo com meus arcanos de viagem.
Aliás, quais são os seus?


L.

12 de fevereiro de 2011

A ARTE DE MANEJAR COLUNAS E LEÕES


The Force - Waite-Smith Tarot

Não existe arcano melhor ou pior, nem mais fraco ou mais forte. Existe o poder de cada um que nos toca de acordo com a nossa leitura de mundo. Com a nossa poesia pessoal. Tenho descoberto n´A Força uma grande aliada para solucionar problemas, sabe? Uma espécie de feiticeira que coloco em prática mentalmente. Dependendo do humor do leão, o olhar dela furta toda a atenção e joga o encantamento. Aí está feito. As mãos hábeis na mandíbula, as pupilas no alvo. Eis o controle. Coragem, palavra de ordem aqui.
La Force - Gringonneur
Outro dia, ao telefone com meu amigo Nei Naiff, conversamos sobre o que há de obrigatório para se ver sobre Tarot em Paris, já me programando pra viagem. Anotadas as dicas, me peguei questionando qual era mesmo aquele baralho em que O Louco é gigante e faz malabares e que a Força não tem leão, mas uma coluna – representação de uma das Virtudes cardeais, sempre presentes. Aquele que a LoScarabeo lançou com o nome de Tarot of the Renaissance, com bordas douradas e frufrus. Charles VI, outro nome famoso dele. “É o Gringonneur!”, bradou o Nei, “é o que chamam de Gringonneur”, e tudo me veio à mente. Passada a amnésia, fiquei com a A Força na cabeça. A coluna havia se quebrado há alguns dias, mais precisamente na minha resistência, quando passei por umas experiências nada agradáveis com mudança de casa e trâmites de fim de contrato. O arcano da vez, saquei, era mesmo A Força, exigindo de mim uma posição física e mental voltada totalmente para a ação. Mesmo com a gripe [a exemplar reação ao medo da mudança, segundo os metafísicos da saúde] mais forte que já peguei, temperada com nervosismo e uma longa viagem até a cidade em que eu estudo, comecei a mudança de casa e a mentalização da carta – plasmando na minha mente o sorriso indiferente da dama diante dos meros detalhes do cotidiano e assimilando toda a destreza necessária para concluir os compromissos sem tanta alterações de humor – e de saúde, né? Mimetizar o esforço da domadora, curvar-se para arrastar móveis e carregar livros a coluna da vez – para tomar consciência do meu corpo e do meu estado mental diante dos problemas e também das novidades. Uau, espelhar as lâminas é uma técnica mágica. O feitiço possível da imagem.
Tarocchi di Mantgna - FORTEZA XXXVI
Hoje, uma semana depois, sarei dos olhos vermelhos e da coriza: aceitei a minha vulnerabilidade. Percebi, compreendi e imitei internamente a serenidade que existe nos olhos daquela feiticeira de leões; a firmeza dos olhos tranqüilos daquela dama de véu negro, ciente de que o peso do pilar depende do quanto ela acredita que pode agüentar. Entendi que acreditar somente no que desejamos ou tememos não é muito saudável. O que vale é penetrar no caos e mostrar as garras. Assim resolvi todas as burrocracias junto de pessoas queridas e já não penso “ah, tá louco, não quero nunca mais passar por isso”, mas sim “ótimo, eu consegui. Agora extraio sabedoria dessa situação para enfrentá-la com toda a coragem se algo parecido ou pior me acontecer”. Aprendi a ter segurança diante da incerteza e do improvável. Enaltecer sincera e coerentemente a magia pessoal é opção e responsabilidade cada um. Por isso o trabalho com o arcano felino já faço há anos, mas sob a égide da virtude começo agora. Em mãos o meu Tarocchi di Mantegna.

Um beijo corajoso aí,
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L.
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P.S.: Nei, vi o link do Renaissance da Lo Scarabeo que você mandou, mas eu queria mesmo é uma réplica do original. Nada bobo eu, né?
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IMAGENS | galerias do Clube do Tarô. Aliás, clique aqui e saiba mais sobre o Gringonneur que não é o Gringonneur.

4 de fevereiro de 2011

TRABALHANDO COM O JULGAMENTO




Há alguns dias recebi um e-mail bastante verdadeiro de uma leitora.
Clara* é mãe de dois filhos, trabalha e não tem marido. Comentou do contato com o Tarot e com a Astrologia que mantém há 20 anos, do jogo de cintura para dar conta do trabalho e da doença do filho e ainda da dificuldade em se abrir para um novo romance, uma nova empreitada pessoal. Para entender melhor o momento, Clara escolheu um arcano. Veio O JULGAMENTO. Alegou que não tinha encontrado muita coisa aqui no Café e me pediu algumas palavras para meditar um pouco.

Pois bem. O Julgamento. Desde 2005 tenho desenvolvido uma prática bastante eficaz para o treinamento da intuição: O TRABALHO COM O ARCANO, ou DIÁLOGO COM O ARCANO. Nesses seis anos pude vislumbrar a pluridimensionalidade de cada um por meio da conversação e da meditação, ouvindo as vozes e as mensagens tão certeiras e precisas. Mas sempre, claro, com os pés no chão. Sem nenhum tipo de devaneio esquisotérico que me jogue longe da coerência simbólica e pessoal. Aliás, incoerência é o que tenho visto por aí com a maioria dos interessados no assunto se mostrando verdadeiros consumistas de baralhos bonitinhos e diferentes, abarrotando as redes sociais com informações vazias e achismos sobre o que um arcano faz ou deixa de fazer. Mas isso é outro assunto.

Surgite ad judicium. É prudente trazer o arcano pra você, Clara. Mesmo já respondido o seu e-mail, fiquei pensando que a sua experiência com o Tarot poderia lhe ajudar a entender melhor o que este arcano escolhido exige de você e também o que ele lhe oferece. Primeiro, analise a imagem. Para "abri-la", é preciso familiarizar-se com ela. O trabalho começa quando você se dispõe a lê-la, a ouvi-la. Como um livro repleto de figuras, em que a narrativa está plasmada nas cores e formas. Pense num arcano isolado como uma página crucial para o entendimento do livro.

O que vem primeiro à mente? A imagem fala, o que você ouve?

Intuitive Tarot, Cilla Conway.

O Renovador, o Renascimento, o Juízo... Anote tudo o que a figura está mostrando e parta depois para o que você sente, que é um passo da interpretação. Ela exige, num primeiro momento, uma postura emocional ainda mais forte e confiante de que tudo pode ser extremamente positivo e diferente daqui pra frente. Você acredita em você? Então está na hora de reconhecer e respeitar a sua intuição. Respire fundo sempre que tiver alguma folga. Sinta o seu corpo. Sinta o seu coração batendo. Atitudes simples como essas lhe ajudam a redefinir contato com você mesma. Sem esse contato, sem aceitar a si mesma, incondicionalmente, nada funciona bem. Reconheça o seu corpo, aceite o amor e abrace as novidades. Unir o Céu e a Terra: um equilíbrio possível entre adversidade e descanso, prazer e esforço. É o que O Julgamento lhe traz de início.

O TRABALHO COM UM ARCANO é uma técnica poderosíssima de diálogo, de interação e sobretudo de humildade diante dos arcanos como mestres. Lá na
Revista tenho mostrado a intrínseca relação entre a imagem e o leitor, que somos nós - tarólogos ou consulentes. É importante também, durante uma consulta, deixar que a pessoa veja e/ou toque as cartas escolhidas, mesmo se não tiver nenhum conhecimento do assunto e estiver interessada apenas nos resultados. É difícil tentar definir a variedade de efeitos que uma imagem pode surtir no inconsciente humano, mas o contato é sempre necessário. É assim que podemos perceber nossas próprias fábulas e nossas alegorias mais secretas sobre nós mesmos. A sabedoria e a bem-aventurança vêm daí.



Sei que a mensagem foi positiva para você, Clara. Continue com ela. Um arcano é inesgotável, como a vida em todas as suas páginas. Com o maior respeito e gratidão, desejo que o seu caminho seja repleto de significado e verdade.

Leo



__________________________
* Nome fictício.

26 de dezembro de 2010

ARCANO DO ANO



Despe-te das palavras e te aquece.
Toma nas mãos esses odres de terra.
E como quem passeia, leva-os ao mar.
Se tudo te foi dado em abundância
O sal e a água de uma maré cheia
Eu te darei também a temperança.

Deita-te depois e vibra tua garganta
Como se fosse um início de um cantar.
Não cantes todavia.
Aqui, zona de tato e calor, margem do ser
Larga periferia, olha teu corpo de carne
Tua medida de amor, o que amaste em verdade.
O que foi síncope.
Todavia não cantes na perplexidade.


HILDA HILST
Memória | Trajetória Poética do Ser (I)



NOTA
Desculpem a poesia jorrando. Confesso que a falta de tempo tem posto o blog de lado, mas não no meu pensamento. E nem as palavras que tenho trazido faltem com a profundidade. Viajando mentalmente por todo o meu 2010, as palavras, os lugares e as pessoas precisam ser estudadas empiricamente, como na feitura de uma obra. A TEMPERANÇA vem pra isso. É meu arcano pessoal e devo a ele ainda mais trabalho. Os resultados vocês veem por aí, nas letras e nas imagens. E continuo por aqui temperando - com a licença do trocadilho - as cartas com seriedade, inovação e poesia, que é justamente o alimento primordial dos arcanos.



Obrigado pela companhia e pela amizade.

Leo