21 de julho de 2008

CARTAS DO AMOR

Um enigma de ouro, sangue e paixão
Detalhe de “La Primavera” de Botticelli, 1482.




"Il vous aime, c'est secret, lui dites pas que j'vous l'ai dit..."
Carla Bruni

Domingo é dia de Café Tarot. Pra mim é todo dia, principalmente durante as tardes ensolaradas do interior paulista onde me permito longa folga, aproveitando o jardim e a cortina de heras próxima à mesa com xícara, arcanos e livros bem distribuídos. Após uma leitura com um cliente antigo, levo meu café até a boca, ergo uma carta do Visconti-Sforza, próximo da fumaça: Os Enamorados. “Um banho de sangue”, penso alto assim que termino o gole.


O momento dos amantes – Tarô Visconti-Sforza Pierpont Morgan-Bergamo.
Eis a cena do enlace entre Francesco Sforza e Bianca Maria Visconti – sugestão de Stuart Kaplan no primeiro volume de sua Enciclopédia do Tarô. Seria essa ligação de sangue o motivo do vermelho vivo? As casas, praças e palácios milaneses, lavados pelo fluido da vida numa mistura de duques, nobres e governantes. Mas talvez o que se nota é que se torna inadiável, interessante e importante a ser comentado. O Cupido, acima do casal, tem asas rubras. A esfera direita do seu cérebro parece exposto. Do órgão genital, a vermelhidão sugere sangue expelido. Ou vinho, o próprio sangue dos deuses, embriagando os prometidos quando mostro o Ás de Copas transbordando na minha imaginação. Ele não voa; prostra-se sobre um pedestal quase imperceptível. Fico sabendo, posteriormente, que seria uma fonte. Aquela tal da Eterna Juventude, ainda mais na cidade plena das mil e uma construções. Suas asas, então, encharcadas. Penso nesses ornamentos. Dedico-lhes certo tempo enquanto os leio, ouvindo o canto de Safo.

Francesco Sforza e Bianca Maria Viscont - pinturas atribuídas a Bonifácio Bembo, 1460.
Não dá para atribuí-los apenas à deterioração natural do trunfo. Kaplan explica que o revestimento de fundo poderia ser de um ouro inferior ao dos demais arcanos. Sei que tudo faz sentido nas páginas do tarô. Muita, muita atenção.

O anjinho vendado segura uma flecha em cada mão. “Pois bem”, eu me pergunto, “cadê o arco, Cupido?”. “Está com ela”, me responde assim que desviro, por impulso do acaso, a lâmina mais próxima – A Morte. Tânatos que acompanha Eros, óbvio. Se eu tenho o esqueleto junto à primeira carta, percebo que têm sido equivocadas as noções do amor ao pensar que ele permanece (ou que deveria permanecer a qualquer custo) igual para todo o sempre. Mas o amor só é autêntico quando dá liberdade, já que tudo é uma constante transformação - ainda mais quando ele vem de repente, sem qualquer esforço, como um presente natural. Se verdadeiro, não morre; transforma-se. Noção básica da ciência. E do coração, claro.



A Morte (Pierpont Morgan-Bergamo) e Os Enamorados (Cary-Yale).
Aqui o pano que antes cobria a visão do garoto-amor está preso à testa do crânio. A Inominável conhece seus alvos. Cada um tem sua hora e ela não perde a mira. Parei. Brinco de quebra-cabeça com os dois arcanos – um antes, o outro antes do primeiro – experimentando uma seqüência para possíveis epifanias arquetípicas. Sempre possíveis, sabemos todos.

O amor, a morte, AMORte, escolhas, morrer, escolher morrer... ESCOLHER MORRER?! “Amar é deixar-se matar”. Pronto, consegui. As duas divindades gregas desabrocham em conceito prático. Atuar com o arco é uma função nobre, um exercício de espírito. É a arte do cavalheiro, que garante a caça, envolve a pretendente. Sempre carregando um sentido masculino, a flecha penetra e fecunda o veneno, agindo como um raio – modifica aquilo que toca. Ouço sempre dizer no duplo caráter do querubim dos casais. Seria, o outro lado, uma força perniciosa que conduz à ruína, já que exerce poder sobre os homens, sobre a constituição e o curso do Mundo.

Lanças e flechas sem saber em quem – ofício do nosso Eros – é antecipar mentalmente a conquista de um bem fora do alcance. Arriscar, brincar com/no acaso. E quem sabe se ele não espia lá do alto, por uma brechinha do tecido? Ele é quem transtorna, desequilibra e invade o mortal. É a morte súbita, fulmina a vítima. Tanto as do Amor como a da Morte, as flechas atingem o alvo bem no meio. São certeiras, apesar de tudo. Com Ovídio aprendi sobre elas: “se forem de ouro, elas inflamarão o pretendente”. É assim no Visconti-Sforza. O arqueiro do amor e o arqueiro da morte guardam este segredo. Conversam e competem, será?

Cena do casamento em 1441 na Igreja de San Sigismondo, em Cremona.
Pertencente ao “
Codice de Donazione”, 1464.

Não meço o tempo e puxo outra carta. Agora é o Luminoso que se mostra. Apollo, o deus arqueiro. Os relatos míticos garantem que suas flechas são do mais puro fluido da beleza, temperadas docemente em seu coração. Mas Apollo é também aquele que entrega a peste: para vingar honra de Crises, seu sacerdote, semeou a Morte no acampamento grego nas praias de Tróia. No Pierpont Morgan-Bergamo, temos o jovem sobre uma nuvem carregada, segurando o sol acima de seu corpo. É o rosto de Febo que reluz no tom ígneo. Do fogo, do sangue, da vida. E se for uma máscara? É uma possibilidade. O pequeno Eros, já que tem asas, faz o papel do deus. A encenação greco-romana dos sentimentos que rondam a cidade, lá embaixo. E então tomemos distância das banalizações sobre o Deus-Luz que o reduzem à figura de um belo rapaz eternizado em desgraças amorosas, ou então a uma simples oposição nietszcheana de Dioniso – nada de superficialidades agora. Apollo irradia vitória, domínio e entusiasmo pela vida. Casa a paixão e a razão: ilumina, conscientiza e transcende expectativas e desafios.

Posições semelhantes: Apollo arqueiro de 460 a.C. no Museu do Louvre e o Sol.
A moral desse enigma só pode ser esta: diante das escolhas ou mesmo das decisões do destino, morremos individualmente, já que o amor é encontro de vida e morte. Os amantes se deparam com o desejo de dissolver o “eu” e o “você” em uma unidade. Estão separados da própria origem e então caminham de volta para o todo. O desejo de voltar para casa, o próprio coração.

O Sol, portanto, chega para clarear a realidade e as necessidades afetivas. É a maturidade, a confiança, a nitidez, a entrega enquadrada e pintada no dourado. E qualquer um que tenha a audácia de afirmar que domina o baralho deve ao menos respeitar seus segredos e esforçar-se para traduzi-los sem pretensões. Deve deixar-se dominar por ele, como seus sucessores, clássicos e modernos. Deixar-se dominar pelo amor, no entanto, é uma conseqüência. Esteja o casal pronto ou não, ele morre, renascendo em união que ultrapassa os tempos. Concreto, lívido, presente. Como teria sido com o casal italiano. Em juramentos de sangue, em vinho, em ouro.


P.S.: AMOR que se mostra ao espelho: ROMA.
Embarco logo.


Leo



FONTES

Enciclopédia do Tarot - volumes I e II, de Stuart Kaplan.

Imagens: Google e Taroteca

16 de julho de 2008

180 ANOS DE JABOTICABAL


Amanhecendo velha, firme e forte.

Não, eu não nasci em São Paulo. Nem na Itália, mesmo que meus antigos tenham vindo lá dos arredores de Cremona. Sou jaboticabalense, conterrâneo da Piovani e de alguns outros que aparecem por aí. Confesso que foi morando fora, de uns tempos pra cá, que comecei a sentir essa cidade. Sentir falta, sentir prazer em voltar pro seio dela e sentir saudade, até. Sou ligado em raízes. Ingrato aquele que maldiz seu berço geográfico, por pior que seja. Se não fosse por ele, não haveria graça em buscar os sonhos longe, na metrópole ou no estrangeiro. As distâncias diminuem e o coração vaga, sem medo de ir embora depois que chega. E eu dou um rumo à cidade, mesmo que particular. Nas minhas andanças imagéticas. Pelas minhas cartas de tarô.
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O método é simples. Abro o leque e ponho cinco arcanos sobre o mapa da cidade. A força simbólica da carta terrestre é a mesma que a das lâminas: se tenho as ruas, avenidas e pontos principais de um município, fica fácil fazer o trajeto de análise. Ou, literalmente, uma rota de leitura, como diria minha amiga Zoe de Camaris. Cada posição corresponde ao monumento ou localização a que me refiro, de modo que se monte uma espécie de mandala.

A seguir, um resumo simples da leitura-homenagem.


CARTA-CHAVE: 10 DE OUROS
Ano de eleição, ano de mudanças. É assim que este arcano rege o jogo: alertando para as finanças, os projetos, a família, as riquezas da nossa terra.


POLÍTICA: 7, O CARROA carta do ano para Jaboticabal, pela soma tradicional da data de nascimento, é o sexto dos maiores, Os Amantes. Antecedendo a carta do Carro, ilustra as relações sociais, as decisões políticas e, sobretudo, as escolhas da população. É a mensagem de que o progresso chegará de vez à cidade. Cautela na hora de votar.

DESENVOLVIMENTO: 9 DE PAUS
Suado, muito suado. É com esforço que se chega lá, não? Será assim durante mais um ano. Novos estabelecimentos, planos em prática e defesa de interesses será grande. É bom descansar bastante quando se pode, pois o bicho pega e o batente espera, como sempre.


SAÚDE: 16, A TORRE
A Torre quando sai para uma cidade – principalmente quando pousada sobre seu mapa – sugere desastres, demolições, implosões ou mesmo “desconstruções”. Nesta posição, indica a ruptura de atendimentos ou a não-melhora dos serviços públicos referentes à saúde. Um toque muito importante aos candidatos.


COMÉRCIO: 20, O JULGAMENTOO comércio revoluciona este ano, é só parar e prestar atenção. Várias estabelecimentos sendo abertos – bares, lojas, espaços culturais – e também reformados, reestruturados para manter a beleza dos antigos. Renovação.


CONSELHO: PRÍNCIPE DE PAUSO conselho à população é ter garra! Pode parecer clichê, mas é a ordem é ir atrás daquilo que almeja sem esmorecer. Afinal, não existe mérito autêntico sem esforço, seja ele qual for. Ousadia, perseverança e bola pra frente. A cidade, o coração e a vida agradecem.
E eu agradeço. Pela passado, pela estrutura, pela liberdade.
Parabéns, Jaboticabal.

Te amo.


Leo

10 de julho de 2008

A Viagem e a Vaga Música do Tarô


O Clube do Tarô, um dos maiores e melhores sites do Brasil sobre o tema, acabou de publicar o "CANÇÃO DOS CAMINHOS", uma seleção de poemas de Cecília Meireles que ilustram, com palavras, rimas e construções do acaso, os 22 Arcanos Maiores. Batizada por mim de Galeria de Poemas, a obra retrata as andanças da alma da escritora em total analogia com as cartas. Um super estudo para as férias que vale a pena conferir.
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Acesse já o site ou clique aqui para fazer download em formato PDF.

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Um grande abraço ao amigo Constantino Riemma pela oportunidade e colaboração.
E aos queridos leitores, pelo prestígio.

Leo

6 de julho de 2008

O MÉTODO DO SIM OU NÃO



Eis que me deparo com um método bem curioso que a taróloga e escritora Mary K. Greer postou em seu blog. Escrito por Irys Vorel numa matéria intitulada “Como os Ciganos Usam o Tarô”, foi publicado em fevereiro de 1955 na Fate Magazine. Parece ideal para quem deseja respostas rápidas sobre questões decisivas, mesmo que não se utilize de uma  atenta interpretação dos símbolos. Traduzi, a título de curiosidade, e deixo à disposição de quem desejar testá-lo.  


PASSO A PASSO

1. Escreva seu problema ou questão em um pedaço de papel de forma que “sim” ou “nenhum” seja a resposta. Não faça perguntas ambíguas do tipo “eu deveria ficar com fulano(a) de tal?”

2. Remova a A Roda da Fortuna das 78 cartas e coloque-a  aberta [virada para cima] sobre a mesa.

3. Concentrando-se na questão, abra o leque de cartas e com a mão esquerda puxe sete delas ao acaso, como você faz sempre. Coloque-as acima da Roda da Fortuna. Reserve ao lado os arcanos restantes.

4. Feche a carta da Roda [virando-a para abaixo], como as outras sete. Então misture as oito até você não saber onde se encontra o décimo arcano maior.

5. Arraste-as formando um quadrado de quatro posições, de forma que duas cartas estejam em quatro colunas verticais, como nessa que montei com o incrível Tarô de Praga:


• A 1ª coluna (cartas 1 & 5) significa - SIM.
• A 2ª coluna (cartas 2 & 6) significa - LOGO.
• A 3ª coluna (cartas 3 & 7) significa - DEMORA.
• A 4ª coluna (cartas 4 & 8) significa - NÃO.

6. Desvele os arcanos e procure a A Roda da Fortuna. Sua posição lhe dará a resposta:

• Se A Roda da Fortuna caiu na primeira posição, indica “Sim,” e a solução será rápida e favorável à pessoa.

• Se caiu no segundo, “Logo”, significa que você não deveria apressar as coisas indevidamente.

• Se caiu na posição da “Demora”, como no esquema que montei, indica que alguns obstáculos devem que ser superados.

• Se saiu na do “Não”, por fim, indica que alguns ajustes têm de ser feitos e que as circunstâncias do momento bloqueiam a solução satisfatória da questão. O desejo não pode ser cumprido imediatamente.

7. Se sua resposta é qualquer um “Demora” ou “Não,” então reveja todas as cartas neste plano (cartas invertidas não têm nenhuma significação):

• Muitos arcanos de Ouros indicam um arranque financeiro; de Espadas mostram oposição. De Paus sugerem viagens e mudanças. Muitos de Copas indicam circunstâncias afortunadas e, no final das contas, um final feliz, especialmente se o Ás de Copas estiver entre eles.

• Muitos arcanos maiores indicam que a situação está fora de suas mãos: o destino é que está trabalhando. Muitos arcanos da Corte indicam que atitudes de outras pessoas determinarão o resultado.


CONSIDERAÇÕES FINAIS 
E ALGUMAS SUGESTÕES

Os prognósticos, aconselho, devem ser anotados e comparados posteriormente. Das mil e duas maneiras de consultar as cartas, esta vale pelo poder de concisão, mesmo sendo o Tarô   inesgotavelmente rico em sua vastidão simbólica e interpretativa para mantermos os olhos e as expectativas em respostas tão tachativas. Em todo caso, procure agir com absoluta prudência. E que as respostas levem você a uma postura de excelência diante do seu destino.



Um abraço,

L.




FONTE http://www.marygreer.wordpress.com/

13 de junho de 2008

SANTO MESTRE - Osho fala aos seus arcanos (II)



Osho dialoga com o Tarô. Não só com o que leva o seu nome, mas com todos os tipos, de todas as épocas e cores. Hoje, há exatamente um ano e meio da publicação do primeiro artigo, eu apresento mais uma carta ao místico espiritualmente incorreto. Procuro por novas analogias em minha biblioteca mental enquanto tomo o sagrado café da tarde. Aliás, um café-tarot com direito a amigos e arcanos à mesa posta. São várias as semelhanças e as roupagens, algumas totalmente surreais. O discurso do mestre às lâminas prevalece como conchas no oceano. Ouso mudar a ordem das cartas: o Louco acima do Eremita. O penhasco, a escuridão. A montanha, a existência. Assim o jovem mergulha em si, já que “descobrir o seu ser é o começo da vida. Então, cada momento é uma nova descoberta, cada momento traz uma nova alegria.”


O Eremita e O Louco • Osho Zen Tarot

Sua luz ilumina a escuridão. Seu sorriso prenuncia o próximo passo. Não há medo algum. A queda do corpo? Bom, se estou mexendo com o Pendurado, então analisemos por outro prisma: A Nova Visão. Não é exatamente essa a intenção que deve obter o enforcado, crucificado e apostolado arcano 12?




O Pendurado de Marselha e a Nova Visão

Desde o artigo anterior tenho analisado o arcano 5, O Sacerdote. Polêmico, se compararmos a Osho. A briga é feia, dizem os mais desavisados.“Eu não sou um filósofo. Eu não sou tentando criar uma filosofia. Eu não sou um teólogo também. Assim, eu não tenho nenhum sistema de crenças.” Já adianto: não há como considerá-lo Papa se “todas as crenças são venenosas. Um sistema de crenças é um consolo, uma mentira muito doce, confortável e conveniente, pois dá segurança. A verdade só surge quando as crenças forem destruídas.



Mestres em vermelho: Osho e O Papa de Marselha

Bueno, o Louco já está avisado: “A busca pela verdade começa quando você deixa de lado todas as crenças. Se você pode saber, se é possível saber, então porque se contentar em acreditar?” Quanto ao Eremita, “o pico mais alto da consciência é quando você é apenas um ser – sem nada fazer, imóvel, profundamente silencioso, como se não existisse mais. Subitamente toda a existência começa a derramar flores sobre você.”


Imagino uma das confortabilíssimas cadeiras de Osho frente ao Hierofante, cujos súditos voltam suas cabeças na direção do guru: “Vocês acreditam em alguma coisa, mas não sabem nada. Acreditam em teorias.” A santidade ficaria furiosa, creio eu. Os argumentos do Mestre sobre religião, papado e sacerdócio são fortíssimos. Convencem, até. São Francisco de Assis, por vezes “arcanizado” como Louco e Eremita, servirá para apresentar as novas idéias.



São Francisco de Assis, do Tarô dos Santos de Robert Place
O Eremita do Golden Tarot, de Kat Black


Peregrinação. “A vida deve ser uma busca – não um desejo, mas uma procura; não uma ambição para se tornar isso ou aquilo, o presidente de um país ou um primeiro-ministro, mas uma busca para descobrir “quem sou eu?


Eis o diálogo: “você é tão sensível que até mesmo a menor folha de grama passa a ter uma imensa importância para você. Sua sensibilidade lhe deixa claro que a menor folha de grama é tão importante para a existência quanto a maior estrela. Essa folha de grama é única, é insubstituível, ela tem sua própria individualidade.


Grama? O que temos ao pé do caminhante de Marselha?


Todos os diálogos possíveis, começando pela cor dos cajados
O quinto arcano fica entre eles


É clara a mensagem para o Louco de Assis: “Essa sensibilidade criará novas amizades para você – amizade com as árvores, com os pássaros, com os animais, com as montanhas, com os rios, com os oceanos, com as estrelas, pois a vida se torna mais rica na medida em que o amor cresce, em que a amizade cresce.


São Francisco também caminha pela escura floresta ao lado de um gamo, na colagem primorosa de Kat Black. Autêntica comunhão com seus irmãos, os animais. Ele realmente existe, não foge de seu tempo, já que é o seu próprio tempo. Faço dele as palavras de Osho: “Nós pertecemos intrinsecamente à existência. Nós somos partes da existência, somos o seu coração.” É ele o espírito que liga os dois irmãos arcanos, sem deixar o humor de lado, já que é importante em qualquer fase ou relação, indispensável em qualquer jornada, até mesmo à interior. O Eremita marselhês sorri, você vê? Como um anfitrião que aguarda os (s)eus convidados. Uma festa dentro de si. São Francisco sabe que “a risada é a própria essência da religião”, que “a seriedade nunca é religiosa. A seriedade pertence ao ego, é precisamente parte da própria doença”, lembrando de quando se deparou com a lepra. Sermão aos pássaros, que voam livres como ele próprio.


São Francisco de Assis: 
os três arcanos se encontram em nítidas senelhanças na pintura de Giotto

Leva consigo este ensinamento, que “toda brincadeira da existência é tão bonita que a risada é a única resposta possível a ela. Somente a risada pode ser a verdadeira oração, a gratidão”, enquanto o Louco se esgueira pra ouvir esta passagem. Pura identificação. Por falar no arcano zero de Ma Deva Padma, sabemos que ele não tem como voltar atrás – ele já deu o passo inicial, ou final. Sua trajetória, à mente comum é sempre desviar-se do penhasco, ou perguntar o motivo de tal “suicídio”. Mas sua jornada é como o mecanismo de uma piada, de uma consulta às cartas: “a história vai numa direção e, de repente, ela muda de direção!


Nem falei que o Louco ri porque é óbvio. É assim que ele medita, pois “quando você realmente ri, durante aqueles poucos momentos você está num estado profundamente meditativo”. E ele ri de verdade, até o pensamento parar. Ele não, só o pensamento: continua dançando, pois “a dança e o riso são as melhores portas, as mais naturais, as mais facilmente acessíveis.


Sannyasins rindo com o mestre

O Louco ouve: “se você realmente dançar, o pensamento pára. Você dança sem parar, girando, girando... e você se torna um redemoinho – todas as fronteiras, todas as divisões desaparecem. Você nem mesmo sabe onde seu corpo termina e onde a existência começa.” E ele salta. “Você se dissolve na existência e a existência se dissolve em você; há uma superposição de fronteiras” – como a do Eremita, por certo. Deve ser por isso que o velho de Assis nada possui: “se você é uma pessoa meditativa, você dá, você compartilha – você não acumula, você não é mesquinho. Como você pode possuir? Como você pode reclamar que é dono de algo?” Eis a indignação do Pontífice por sempre se encontrar rodeado de luxo e comodidades de suas capelas. Aliás, falando nelas, “não há necessidade de ir à igreja, ao templo ou à mesquita; onde você estiver, seja bem-aventurado, e o templo estará presente” – diz ao arcano sem número. Uma crítica, talvez, às instituições que convertem à base de dinheiro e lavagem cerebral. “O templo real é criado pela bem-aventurança”.


Sobre as técnicas espirituais, Osho é enfático. Louco. Renunciador. “Você precisa se lembrar de que tudo deve ser abandonado para que você permaneça em sua total pureza. Mesmo uma experiência espiritual corrompe; ela é um distúrbio” – e voltamos à lição essencial ao Caminhante. Pura metáfora para a humanidade sedenta por princípios e doutrinas. Meras conchas no oceano de tudo. E ele continuaria tranquilamente acomodado, movimentando sua xícara. Não há discussão que seja burlada pela verdade. Nem prazer maior que a renúncia.



Mais café?

Já trago. Com mais arcanos.


Leo
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IMAGENS
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11 de junho de 2008

TARÔ AMBIENTAL NO CWED

Com Clarice e o astrólogo Alexey Dodsworth.

Ótimo ter participado da quarta edição da Conferência de Wicca e Espiritualidade da Deusa, considerado o maior evento de Wicca do Brasil. Teve gente de vários lugares do país (só faltou você, Íris!), uma mega feira pagã e até videoconferências internacionais. Foi a chance do Tarô Ambiental, que não teve tempo de ser apresentado lá no Nova Consciência. Pra ficar melhor ainda, as associações filosóficas do astrólogo Alexey complementaram minha teoria.
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Em breve toda a abordagem e mais alguns ensaios serão publicados em livro. E aqui no blog postarei algumas noções apresentadas, é só esperar. Agradeço o convite do Claudiney e parabenizo toda a equipe, super solícita.
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Bençãos Dela,
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Leo

28 de abril de 2008

“Je Suis L'Art”: O LADO MADONNA DA FORÇA

Madonna | Versace, 1995.

Madonna é a lenda viva da música. O arcano máximo do pop. É a artista mais influente, ispiradora e original do mundo. Sua existência tem mexido com as pessoas e ela tem o mundo nas mãos. Mas porque esse mel todo? O que explica a forma, a beleza e a singularidade dessa mulher? Para os astrólogos é fácil: leonina com ascendente em Virgem. Aspectos pra lá de significativos quando o assunto é o domínio, a apreensão, a disciplina. Fogo e Terra. Carne quente. Se eu me atenho às cartas, é uma poderosa Rainha de Ouros, totalmente centrada, em pleno controle de seu corpo. Material Girl. E quem é a virgem que domina o leão? A Força, claro. Como diria Aleister Crowley, Luxúria para os íntimos.


A Força da Luxúria – ontem, hoje e sempre.

Nascida um pouco antes da Cúspide Leão-Virgem, tem a LIDERANÇA como atributo principal. Grandes poderes, grandes responsabilidades – para o Homem Aranha, uma lição; para Madonna, a mais pura realidade – a tônica de alguém que confia em seu taco, que assume riscos e conquista. Os filhos, a caridade, a voz que fala mais alto. Vende o que produz. Sempre, literalmente. Talvez um excesso de autoconfiança e um sentido forte de infalibilidade. Prevalece a idéia da mitologia pessoal. Várias vidas, várias obras. De arte, de polêmica, de êxtase. A fama grita alto. E o amor ainda mais.

Madonna e o pequeno David.
Ah, já ia me esquecendo: Madonna chegou ao mundo em 16 de agosto de 1958. Analiso com calma: 16 no tarô é carta denominada A Torre, temida por tantos. Aliás, quem tem medo da Madonna? O arcano é direto – choca, destrói, faz romper na marra. É só voltar algumas décadas no tempo: Like a Virgin e todo o repertório que trincou estruturas sociais, morais e mesmo religiosas. Raios e mais raios que desmascaram o mundo das falsas formalidades. Deeper and deeper na Mansão Deus. Cada vez mais.


A Torre e a máscara.

Também podemos extrair seu Arcano de Nascimento pela soma: 1+6+8+1+9+5+8= 20, O Julgamento! Outra carta de fogo, segundo Crowley. Os grandes eventos, as novidades marcantes (e decepcionantes para os durões), a surpresa dos fãs e dos invejosos. Cada manifestação de Madonna é um evento. Live to tell, baby.


O Julgamento e a Crucificação. O Papa foi convidado.

Seus discos não são lançados, eles acontecem. Ela estréia a cada dia, renasce em cada turnê. Aliás, Madonna adora o novo. Se rende (outra palavra-chave deste trunfo) ao que lhe traz conforto e ao que lhe completa no momento. O nome "Esther", adicionado aos seus documentos recentemente, dá origem à "estrela". Estrela Madonna - nada mais óbvio.
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O novo nome e a pura expressão do Arcano 17.

A religiosidade tem espaço e importância. Há alguns anos foram os mantras, agora as fitas vermelhas – Like a Prayer, hoje se agarra firme na árvore da Cabala. Tanto que se desconsiderarmos o zero do arcano 20, temos A Sacerdotisa e suas bênçãos: uma mulher espiritualizada que age de acordo com o Livro da Vontade em seu colo. Quem o escreve é a própria Madonna.


A Sacerdotisa de Jacques Vieville.
“We can do anything!” Até mesmo escrever livros infantis.


Madonna, Madonna. Se eu fujo da segunda carta, corro pra terceira: A Imperatriz. Botticelli fala por mim – a Mãe, aquela que amamenta e também a que instrui. Nutre com palavras e canções. La Virgen com el Niño e alguns passos na literatura. Não importa quais ou quantos.

Madonna of the Book, de 1483.
A arte imita a vida.

Aliás, posso até fazer um paralelo entre a imagem da prostituta sagrada – Erotica por si só nos tempos em que a ousadia feria os egos – e a santificada de hoje em dia, livre da maioria dos figurinos luxuriosos e do sexo com mulheres. Salve, salve: há aqueles que tramam sua canonização. The Immaculate. Sexy na estética, na atitude e na manipulação da carreira.


Sagrada e profana, ela abraça e seduz O Mundo.
Completa por si só, como ele.



E isso lhe basta.
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Leo

29 de março de 2008

MÚSICA PARA AS MINHAS CARTAS

Tem gente que joga no mais absoluto silêncio. Alguns apostam na Enya. Há ainda quem prefira jogar ao ar livre, com cães latindo e aviões transitando pelos céus. Liberal como eu sou, faço até repertórios quando fico sozinho lendo as cartas. Chill out por opção, transformo qualquer ambiente em um lounge particular.
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Mas um desses repertórios é composto pelas mais lentas de SCHILLER, projeto do músico alemão Christopher von Deylen. Sucesso no mundo, tem conquistado até mesmo quem não conhece a boa música eletrônica, principalmente batidas leves acompanhadas por vozes serenas. Vale a pena conhecer todos os álbuns, que contam com vários convidados famosos - entre eles Sarah Brightman e Moya Brennan.



Sim, pode crer, tarô também é música. Depois dos filmes e dos livros, começo a caçar arcanos em clipes. Por isso trago uma típica jornada d´O Louco pra você: Herzschlag, do novo álbum Sehnsucht. Preste atenção às estradas e aos horizontes. O Mundo ao seu redor. Aos seus pés.


Todos os caminhos,

Leo

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Saboreie sem moderação:
SCHILLER site oficial